Daqui a 20 anos…

Perguntaram-me: “Como serão os Educadores e os Professores daqui a 20 anos?” Fiquei, então, a pensar: o mundo anda a mudar a um ritmo vertiginoso, será que isso também vai fazer mudar muito o que os Educadores e os Professores serão daqui a 20 anos? Talvez sim… e talvez não, pois há princípios, valores, que são de todos os tempos.

À guisa de exemplo, e humildemente, vou referir-me ao trabalho que sempre desenvolvi durante a minha longa vida profissional, e que assentou no que me pareceram ser princípios corretos.

Começava por observar os meus alunos, fossem eles crianças ou adultos, a fim de os ir conhecendo cada vez melhor. Fiz sempre por os escutar, pois creio que escutar os alunos é mais importante do que falar. (Não, o Educador e o Professor estão longe de saber tudo, e não é debitando os seus conhecimentos que os alunos aprendem ou se motivam mais. Falar, sim, mas apenas o indispensável.)

Desde o início, tentava estabelecer com os alunos uma forte relação afetiva.

E, sempre presente, ocupando um lugar de destaque, estava o desenvolvimento da imaginação e da criatividade. Creio que foi Ortega Y Gasset que afirmou: “o povo que já não cria ou está morto ou, pelo menos, moribundo”.

Estou convicta de que estes aspetos, tão importantes para mim no passado, continuam a sê-lo no presente e sê-lo-ão no futuro.

Que posso desejar mais aos Educadores e Professores para daqui a 20 anos, além do que já disse? Que eles não escolham esse caminho apenas porque é preciso ter uma profissão, mas porque se sentem vocacionados para ela. Deste modo, serão pedagogos apaixonados, e os que o são nunca se contentam em ficar apenas com o diploma que obtiveram. Desejam sempre saber mais, contactar com novas filosofias educativas. Fi-lo também eu, sempre que possível, de modo a poder dar mais aos meus alunos. E foi isso que me proporcionou conhecer a Helena Rodrigues e o trabalho que ela desenvolvia com bebés… e que me fascinou.

Como era possível eu pensar que a música devia ser “levada” às crianças apenas a partir dos três anos, se até já sabia que o primeiro ano de vida é o mais importante… do resto das suas vidas?

É também essencial que os Educadores e Professores não se isolem, tentem trabalhar com colegas, isso só os enriquecerá. “A pedagogia é sobretudo cooperação, e são as diferenças que nos educam”, afirmou recentemente António Nóvoa.

A propósito de António Nóvoa, trago na memória uma experiência riquíssima que vivi com ele: logo após o 25 de abril de 1974, e a pedido do Ministério da Educação, fomos às Escolas do Magistério Primário de todo o país exemplificar aos formadores o que era uma nova disciplina intitulada “Movimento, Música e Drama”, a qual havia sido incluída no Programa do Ensino Primário (atualmente 1.º Ciclo do Ensino Básico) e, por isso, passara a integrar também os curricula da formação de Professores.

Tanto o António Nóvoa quanto eu éramos dois professores apaixonados pelo que fazíamos, e o nosso mútuo entendimento foi imediato. Durante alguns anos — e embora bem mais superficialmente do que quando trabalhávamos com os nossos alunos, dado o curto tempo dessas Ações de Formação (com duração de dois ou três dias) —, nós, intuitivamente, baseámos o que fazíamos com aqueles colegas nos aspetos que acima fui referindo.

Por fim, recordo o que Sebastião da Gama, poeta e professor, escreveu no seu “Diário” a propósito dos alunos difíceis que tinha, e que pode ser resumido no título de um seu soneto: “O segredo é amar” — AMAR os alunos dotados e os menos dotados, os interessados e os indiferentes, os bem-comportados e os rebeldes, ou seja: todos!

E desejo vivamente que, daqui a 20 anos, os que se dedicam à Educação continuem a conhecer o significado do título desse soneto e, sobretudo, a pô-lo em prática, pois isso será indispensável para que floresça uma pedagogia de sucesso. Sim, de facto, “O segredo é amar”.

Ana Ferrão