Que momento vive a arte na educação básica? Imaginamos o futuro

Maravillas Díaz
Professora jubilada da Universidade do País Basco

 

Era isto que eu precisava de ver!

Permitam-me começar com uma peripécia pessoal distante no tempo (uns 30 anos) mas muito presente na minha memória. Visitava em família o recém-inaugurado Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, em Madrid. Passeávamos pelas galerias de arte contemporânea, contemplando com ávido interesse as obras expostas de artistas do séc. XX quando, ao chegarmos a uma sala não especialmente ampla e cujas paredes estavam cobertas por duas telas (457,2 x 457,2 cm), o meu filho de quatro anos se colocou no centro e exclamou bem alto: Era isto que eu precisava de ver! Podem imaginar o impacto que as suas palavras causaram entre os que contemplavam a obra abstrata “Os patos de Buen Retiro” do pintor e realizador de cinema americano Julian Schnabel. Quantas vezes o meu marido e eu relembramos este momento, perguntando-nos o motivo do entusiasmo do nosso filho perante a contemplação da proposta de Schnabel.

O que pensei nessa altura, e penso hoje, é que as instituições culturais, neste caso a visita a um museu, podem provocar nos seus visitantes de qualquer idade, entusiasmo, imaginação e criatividade, aspetos importantes a ter presentes a nível educativo, seja qual for a etapa de educação que percorrem.

Gerar espaços: Imaginar e construir realidades

Talvez partilhem comigo que, em matéria bibliográfica destinada à arte na infância, encontramos numerosas e variadas propostas de livros, teses doutorais e artigos académicos, como nunca teria imaginado nos meus primeiros tempos enquanto docente de Educação Musical, nos anos 70. O interesse crescente na publicação de resultados de projetos de investigação-criação realizados no campo das artes, tanto em contextos nacionais como internacionais, é na atualidade um feito constatável. No entanto, nem sempre este conhecimento derivado das investigações realizadas, tem o resultado esperado no âmbito da escola ou da universidade. Assim, projetos artísticos educativos com resultados altamente satisfatórios, uma vez publicados e por diferentes motivos, caem no esquecimento sem perspetivas de continuidade.

Promover o diálogo entre docentes de diferentes áreas artísticas e agentes de centros culturais pode ser um importante passo não só de aprendizagem, como também de continuidade dos nossos projetos e trabalho em sala de aula. O desenho conjunto de propostas para determinadas atividades musicais, plásticas, visuais, teatrais, cénicas, performativas, etc., convida a um intercâmbio de conhecimentos do qual sem dúvida a comunidade educativa no geral beneficiará. Por outro lado, as propostas educativas fora do centro escolar são geralmente recebidas pelos alunos com entusiasmo. Se a isto juntarmos a possibilidade de contactar diretamente com os artistas criadores, o nosso objetivo, como impulsionadores de ideias criativas no processo de educação-aprendizagem, obterá ainda melhores resultados.

Por um futuro possível no desenvolvimento social e humano. Reimaginar juntos o nosso futuro

A educação é a base para a renovação e transformação das nossas sociedades, recorda o relatório da UNESCO “Reimaginar juntos o nosso futuro. Um novo contrato social para a educação”. No seu quarto capítulo, “Os currículos e a evolução do conhecimento comum”, o relatório reconhece que a expressão criativa através das artes tem um enorme potencial para o futuro. A educação no domínio das artes (música, teatro, dança, design, artes visuais, literatura, poesia, etc.) “pode melhorar consideravelmente as capacidades dos alunos no domínio de competências complexas e pode apoiar a aprendizagem social e emocional em todo o currículo” (p. 87). Um interessante reconhecimento transversal das artes nas duas dimensões afetiva, expressiva, intelectual e cognitiva, que obriga a uma profunda reflexão da comunidade educativa.

O relatório, no seu todo, defende que se reexamine e repense a educação de modo a promover cenários mais justos e sustentáveis. Convida também a responder a três questões essenciais sobre a educação que queremos para 2050: O que devemos continuar a fazer? O que devemos deixar de fazer? O que devemos reinventar completamente? Respostas que nos responsabilizam a unir esforços para assumir um novo contrato social que ajude a superar a discriminação, a marginalização e a exclusão. Para tal, e sem querer parecer superficial, apelo a que se preste mais atenção ao estudo das artes na formação de professores, que é atualmente muito insuficiente, e que impactará a educação dos nossos alunos. Existem evidências consideráveis que apoiam a aprendizagem das artes no currículo como ferramenta para a melhoria da sociedade, da educação e da cidadania. Estes estudos confirmam a necessidade de reconhecimento das áreas artísticas por parte de legisladores, educadores e instituições, e exigem uma atitude recetiva e inclusiva em relação às artes na escola (Cabedo-Mas; Díaz-Gómez, 2015)